Poesias Escondidas
segunda-feira, 21 de dezembro de 2009
Valsa Da Solidão
Onde estava tanta estrela que eu não via
Onde estavam os meus olhos que não te encontravam
Onde foi que pisei e não senti
O ruído dos teus passos em meu caminho.
Onde foi que vivi
Se nem me lembro se existi
Antes de você.
Ah! Foi você quem trouxe essa tarde fria
E essa estrela pousada em meu peito
Ah! Foi você quem trouxe todo esse vazio
E toda essa saudade, toda essa vontade de morrer de amor.
Fica Melhor Assim
Eu vou você fica
Fica melhor assim
Meu Rio de Janeiro
Aceso atrás de mim.
Os mares são palavras
Que deixo pra você
Desenhe na areia
Uma frase até o fim.
Eu vou você fica
Fica melhor assim
Meu coração inteiro
Quer um outro só.
As luzes da cidade
Momentos que vivi
O mar vai apagar
Você dentro de mim.
Eu apaguei a luz do apartamento
Pra só voltar em paz depois de clarear o sol
Na tela branca da parede
Sem foto, sem cartaz, sem mais...
segunda-feira, 14 de dezembro de 2009
Coisa Mais Linda
Coisa mais bonita é você
Assim
Justinho você.
Eu juro
Eu não sei porquê você
Você é mais bonita que a flor
Quem dera
A primavera da flor
Tivesse todo esse aroma de beleza que é o amor
Perfumando a natureza
Numa forma de mulher.
Porquê tão linda assim não existe a flor
Nem mesmo a cor não existe
E o amor
Nem mesmo o amor existe.
E eu fico um pouco triste
Um pouco sem saber
como é tão lindo o amor
Que eu tenho por você
Coisa mais bonita é você
A Flor & O Espinho
Tire o seu sorriso do caminho
Que eu quero passar com a minha dor
Hoje pra você eu sou espinho
Espinho não machuca a flor.
Eu só errei quando juntei minh'alma a sua
O sol não pode viver perto da lua.
É no espelho que eu vejo a minha mágoa
A minha dor e os meus olhos rasos d'água
Eu na sua vida já fui uma flor
Hoje sou espinho em seu amor.
segunda-feira, 7 de dezembro de 2009
Hino do Clube de Regatas do Flamengo
Uma vez Flamengo,
Sempre Flamengo.
Flamengo sempre, eu hei de ser.
É meu maior prazer vê-lo brilhar,
Seja na terra, seja no mar.
Vencer, vencer, vencer!
Uma vez Flamengo,
Flamengo até, morrer!
Na regata, ele me mata,
Me maltrata, me arrebata.
Que emoção no coração!
Consagrado no gramado;
Sempre amado;
O mais cotado nos Fla-Flus é o "ai, Jesus!"
Eu teria um desgosto profundo,
Se faltasse o Flamengo no mundo.
Ele vibra, ele é fibra,
Muita libra já pesou.
Flamengo até morrer eu sou!
sexta-feira, 4 de dezembro de 2009
Violão Vadio
Novamente juntos eu e o violão
Vagando devagar, por vagar
Cantando uma canção qualquer, só por cantar
Mercê da solidão
Vadiando em vão por aí
Nós vamos seguir,
Outra rua, outro bar, outro amigo, outra mão
Qualquer companheira, qualquer direção
Até chegar em qualquer lugar
Qualquer que seja a morte a esperar
Jamais meu violão me abandonará
Se eu vivi, foi inútil viver
Já mais nada me resta saber
Quero ouvir meu violão gemer
Até me serenizar
quinta-feira, 3 de dezembro de 2009
Chega De Saudade
Vai minha tristeza
E diz à ela
Que sem ela não pode ser
Diz-lhe numa prece
Que ela regresse
Porque eu não posso
Mais sofrer...
Chega de saudade
A realidade
É que sem ela
Não há paz
Não há beleza
É só tristeza
E a melancolia
Que não sai de mim
Não sai de mim
Não sai...
Mas se ela voltar
Se ela voltar
Que coisa linda
Que coisa louca
Pois há menos peixinhos
A nadar no mar
Do que os beijinhos
Que eu darei na sua boca...
Dentro dos meus braços
Os abraços hão de ser
Milhões de abraços
Apertado assim
Colado assim
Calado assim
Abraços e beijinhos
E carinhos sem ter fim
Que é prá acabar
Com esse negócio
De viver longe de mim
Vamos deixar desse negócio
De você viver sem mim
Não quero mais esse negocio
De você longe de mim...
Mas se ela voltar
Se ela voltar
Que coisa linda
Que coisa louca
Pois há menos peixinhos
A nadar no mar
Do que os beijinhos
Que eu darei na sua boca...
Dentro dos meus braços
Os abraços hão de ser
Milhões de abraços
Apertado assim
Colado assim
Calado assim
Abraços e beijinhos
E carinhos sem ter fim
Que é prá acabar
Com esse negócio
De viver longe de mim
Vamos deixar desse negócio
De você viver sem mim
Não quero mais esse negocio
De você longe de mim...
Valsa Da Solidão
Onde estava tanta estrela que eu não via
Onde estavam os meus olhos que não te encontravam
Onde foi que pisei e não senti
O ruído dos teus passos em meu caminho.
Onde foi que vivi
Se nem me lembro se existi
Antes de você.
Ah! Foi você quem trouxe essa tarde fria
E essa estrela pousada em meu peito
Ah! Foi você quem trouxe todo esse vazio
E toda essa saudade, toda essa vontade de morrer de amor.
sábado, 28 de novembro de 2009
Samba Do Approach
Venha provar meu brunch
Saiba que eu tenho approach
Na hora do lunch
Eu ando de ferryboat...
Eu tenho savoir-faire
Meu temperamento é light
Minha casa é hi-tech
Toda hora rola um insight
Já fui fã do Jethro Tull
Hoje me amarro no Slash
Minha vida agora é cool
Meu passado é que foi trash...
Venha provar meu brunch
Saiba que eu tenho approach
Na hora do lunch
Eu ando de ferryboat...
Fica ligado no link
Que eu vou confessar my love
Depois do décimo drink
Só um bom e velho engov
Eu tirei o meu green card
E fui prá Miami Beach
Posso não ser pop-star
Mas já sou um noveau-riche...
Venha provar meu brunch
Saiba que eu tenho approach
Na hora do lunch
Eu ando de ferryboat...
Eu tenho sex-appeal
Saca só meu background
Veloz como Damon Hill
Tenaz como Fittipaldi
Não dispenso um happy end
Quero jogar no dream team
De dia um macho man
E de noite, drag queen...
Venha provar meu brunch
Saiba que eu tenho approach
Na hora do lunch
Eu ando de ferryboat...
Como Eu Quero
Diz pra eu ficar muda
Faz cara de mistério
Tira essa bermuda
Que eu quero você sério
Tramas do sucesso
Mundo particular
Solos de guitarra
Não vão me conquistar
Uh, eu quero você
Como eu quero
Uh, eu quero você
Como eu quero
O que você precisa
é de um retoque total
Vou transformar o seu
rascunho em arte final
Agora não tem jeito
Cê tá numa cilada
Cada um por si
Você por mim mais nada
Uh, eu quero você
Como eu quero
Longe do meu domínio
Cê vai de mal a pior
Vem que eu te ensino
Como ser bem melhor
A Valsa
Tu, ontem,
Na dança
Que cansa,
Voavas
Co'as faces
Em rosas
Formosas
De vivo,
Lascivo
Carmim;
Na valsa
Tão falsa,
Corrias,
Fugias,
Ardente,
Contente,
Tranqüila,
Serena,
Sem pena
De mim!
Quem dera
Que sintas
As dores
De amores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!...
— Não negues,
Não mintas...
— Eu vi!...
Valsavas:
— Teus belos
Cabelos,
Já soltos,
Revoltos,
Saltavam,
Voavam,
Brincavam
No colo
Que é meu;
E os olhos
Escuros
Tão puros,
Os olhos
Perjuros
Volvias,
Tremias,
Sorrias,
P'ra outro
Não eu!
Quem dera
Que sintas
As dores
De amores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!...
— Não negues,
Não mintas...
— Eu vi!...
Meu Deus!
Eras bela
Donzela,
Valsando,
Sorrindo,
Fugindo,
Qual silfo
Risonho
Que em sonho
Nos vem!
Mas esse
Sorriso
Tão liso
Que tinhas
Nos lábios
De rosa,
Formosa,
Tu davas,
Mandavas
A quem ?!
Quem dera
Que sintas
As dores
De arnores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!...
— Não negues,
Não mintas,..
— Eu vi!...
Calado,
Sózinho,
Mesquinho,
Em zelos
Ardendo,
Eu vi-te
Correndo
Tão falsa
Na valsa
Veloz!
Eu triste
Vi tudo!
Mas mudo
Não tive
Nas galas
Das salas,
Nem falas,
Nem cantos,
Nem prantos,
Nem voz!
Quem dera
Que sintas
As dores
De amores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!...
— Não negues
Não mintas...
— Eu vi!
Na valsa
Cansaste;
Ficaste
Prostrada,
Turbada!
Pensavas,
Cismavas,
E estavas
Tão pálida
Então;
Qual pálida
Rosa
Mimosa
No vale
Do vento
Cruento
Batida,
Caída
Sem vida.
No chão!
Quem dera
Que sintas
As dores
De amores
Que louco
Senti!
Quem dera
Que sintas!...
— Não negues,
Não mintas...
Eu vi!
quarta-feira, 25 de novembro de 2009
Inocente Flor
Sempre sem sentir
olho o mundo
e me vejo só
beijo as sombras
que num momento
me adornam um sol
criar num refúgio
um deus em quem me acudo
enfim me acenar
as horas que sublimam o pensar
guiar rumo ao leste
a um céu que deserte
um filho ao tentar
sem asas, um livre voar
Nem temporais verão alguma linha
pois já me retirei
se vendavais trarão alguma vida
que tragam em sordidez
Fechar com flor
fechar inocente flor
bater com dor
bater inocente dor
Tento reagir
ao silêncio que impuro forme
a tristeza que num flanco abrigar
o tesouro que oculta encobre
criar um dilúvio
que ordenhe ouro puro
do sangue a girar
em voltas perdidas no mar
que banha como vulto
o eterno tão confuso
que finge ao deitar
nas ondas, as ruínas do ar
Reparei Que A Poeira Se Misturava Às Nuvens
Reparei que a poeira se misturava às nuvens,
e, sem pôr o ouvido na terra,
senti a pressa dos que chegavam.
Disse-me de repente: "Eis que o tropel avança".
Mas todos me olhavam como surdos,
e deixavam-me sem responder nada.
Vi as nuvens tornarem-se vermelhas
e repeti: "Eis que os incêndios se aproximam".
(Mas não havia mais interlocutores.)
"Eles vêm, eles não podem deixar de vir",
balbuciei para a solidão, para o ermo.
E já por detrás dos montes subiam chamas altas;
ou eram estandartes ou eram labaredas.
Perguntei: "Que me vale ter casa, parentes, vida?
Sou a terra que estremece? ou a multidão que avança?
Ó solidão minha, ó limites da criatura!
Meu nome está em mim? no passado ou no futuro?
Ninguém responde. E o fogo avança para meu pequeno enigma".
Apenas um anjo negro entreabriu seus lábios,
verdadeiramente como um botão de rosa.
"Death"
DEATH?
Por que me falas nesse idioma? perguntei-lhe, sonhando.
Em qualquer língua se entende essa palavra.
Sem qualquer língua.
O sangue sabe-o.
Uma inteligência esparsa aprende
esse convite inadiável.
Búzios somos, moendo a vida inteira
essa música incessante.
Morte, morte.
Levamos toda a vida morrendo em surdina.
No trabalho, no amor, acordados, em sonho.
A vida é a vigilância da morte,
até que o seu fogo veemente nos consuma
sem a consumir.
Distâncias Mínimas
Um texto morcego
se guia por ecos
um texto texto cego
um eco anti anti anti antigo
um grito na parede rede rede
volta verde verde verde
com mim com com consigo
ouvir é ver se se se se se
ou se se me lhe te sigo?
Amar!
Eu quero amar, amar perdidamente!
Amar só por amar: aqui... além...
Mais Este e Aquele, o Outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!
Recordar? Esquecer? Indiferente!...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!
Há uma primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi pra cantar!
E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...
terça-feira, 3 de novembro de 2009
Amor
Quand la mort est si belle, Il est doux de mourir.
V. Hugo
Amemos! Quero de amor
Viver no teu coração
Sofrer e amar essa dor
Que desmaia de paixão!
Na tu'alma, em teus encantos
E na tua palidez
E nos teus ardentes prantos
Suspirar de languidez!
Quero em teus lábio beber
Os teus amores do céu,
Quero em teu seio morrer
No enlevo do seio teu!
Quero viver d'esperança,
Quero tremer e sentir!
Na tua cheirosa trança
Quero sonhar e dormir!
Vem, anjo, minha donzela,
Minha'alma, meu coração!
Que noite, que noite bela!
Como é doce a viração!
E entre os suspiros do vento
Da noite ao mole frescor,
Quero viver um momento,
Morrer contigo de amor!
quinta-feira, 22 de outubro de 2009
Teu Bem
Você faz tudo pro teu bem, meu bem
Você faz tudo pro teu bem...
Você faz tudo pro teu bem
O teu negocio é sair bem
Tem nego que tenta também
Mas como você não há ninguem, meu bem...
Um dia vai, um dia vem
Felicidades pro teu bem, meu bem...
O teu negocio é sair bem
O teu negocio é se dar bem
Não há negocio pro teu bem, meu bem
O teu negocio é sair bem
Tem nego que tenta também
Mas como você não há ninguem, meu bem...
Você vai se dar muitcho bem, meu bem...
De Noite
De noite, amada, amarra teu coração ao meu
e que eles no sonho derrotem
as trevas como um duplo tambor
combatendo no bosque
contra o espesso muro das folhas molhadas.
Noturna travessia, brasa negra do sonho.
Interceptando o fio das uvas terrestres
com pontualidade de um trem descabelado
que sombra e pedras frias sem cessar arrastasse.
Por isso, amor, amarra-me ao movimento puro,
à tenacidade que em teu peito bate.
Com as asas de um cisne submergido,
para que as perguntas estreladas do céu
responda nosso sonho com uma só chave,
com uma só porta fechada pela sombra.
quarta-feira, 21 de outubro de 2009
Meninos Carvoeiros
Os meninos carvoeiros
Passam a caminho da cidade.
— Eh, carvoero!
E vão tocando os animais com um relho enorme.
Os burros são magrinhos e velhos.
Cada um leva seis sacos de carvão de lenha.
A aniagem é toda remendada.
Os carvões caem.
(Pela boca da noite vem uma velhinha que os recolhe,
dobrando-se com um gemido.)
— Eh, carvoero!
Só mesmo estas crianças raquíticas
Vão bem com estes burrinhos descadeirados.
A madrugada ingênua parece feita para eles . . .
Pequenina, ingênua miséria!
Adoráveis carvoeirinhos que trabalhais como se brincásseis!
—Eh, carvoero!
Quando voltam, vêm mordendo num pão encarvoado,
Encarapitados nas alimárias,
Apostando corrida,
Dançando, bamboleando nas cangalhas como espantalhos desamparados.
terça-feira, 20 de outubro de 2009
Soneto Da Mulher Ao Sol
Uma mulher ao sol - eis todo o meu desejo
Vinda do sal do mar, nua, os braços em cruz
A flor dos lábios entreaberta para o beijo
A pele a fulgurar todo o pólen da luz.
Uma linda mulher com os seios em repouso
Nua e quente de sol - eis tudo o que eu preciso
O ventre terso, o pelo úmido, e um sorriso
À flor dos lábios entreabertos para o gozo.
Uma mulher ao sol sobre quem me debruce
Em quem beba e a quem morda, com quem me lamente
E que ao se submeter se enfureça e soluce
E tente me expelir, e ao me sentir ausente
Me busque novamente - e se deixes a dormir
Quando, pacificado, eu tiver de partir...
segunda-feira, 19 de outubro de 2009
Minhas Pequenas Namoradas
Um líquido molhado lava
O céu cor de uvas:
Sob a árvore broto que baba,
Seus guarda-chuvas
Brancos de luas particulares
Das marcas airosas,
Choquem as suas joelheiras,
Minhas feiosas!
Nos amávamos naquela época
Feiosa azul!
Comíamos ovos quentes
E capim do sul!
Uma noite me chamaste poeta,
Loira feia:
Vem aqui receber o chicote
De mão cheia;
Vomitei tua brilhantina
Feiosa preta;
Você cortaria minha mandolina
Com tua careta.
Puá! minha saliva ressecada,
Ruiva feiosa
Ainda infecciona a sacada
Do teu seio rosa!
Ó minhas pequenas namoradas,
Como vos odeio!
Coloquem algum recheio
Em vosso seio!
Pisoteiem os meus restos
De sentimento;
Opa! Sejam bailarinas
Por um momento!...
Suas omoplatas desparafusam,
Ó meus amores!
Uma estrela a seus rins mancos
Girem horrores!
E é pra estas ninharias
Que tenho rimado!
Queria quebrar suas bacias
Por terem amado!
Monte insípido de estrelas vadias
Limpem os cantos!
Vocês morrerão em Deus, chapadas
De vis encantos!
Sob as luas particulares
Das marcas airosas,
Choquem as suas joelheiras,
Minhas feiosas!
quinta-feira, 15 de outubro de 2009
Sangrando
Quando eu soltar a minha voz
Por favor entenda
Que palavra por palavra
Eis aqui uma pessoa se entregando
Coração na boca
Peito aberto
Vou sangrando
São as lutas dessa nossa vida
Que eu estou cantando
Quando eu abrir minha garganta
Essa força tanta
Tudo que você ouvir
Esteja certa
Que estarei vivendo
Veja o brilho dos meus olhos
E o tremor nas minhas mãos
E o meu corpo tão suado
Transbordando toda a raça e emoção
E se eu chorar
E o sal molhar o meu sorriso
Não se espante, cante
Que o teu canto é a minha força
Pra cantar
Quando eu soltar a minha voz
Por favor, entenda
É apenas o meu jeito de viver
O que é amar
sábado, 10 de outubro de 2009
Pelos Caminhos Que Ando
Pelos caminhos que ando
um dia vai ser
só não sei quando
Pergunte ao pó
cresce a vida
cresce o tempo
cresce tudo
e vira sempre
esse momento
cresce o ponto
bem no meio
do amor seu centro
assim como
o que a gente sente
e não diz
cresce dentro
razão de Ser
escrevo.
e pronto.
Escrevo porque preciso,
preciso porque estou tonto.
Ninguém tem nada com isso.
Escrevo porque amanhece,
e as estrelas lá no céu
lembram letras no papel,
quando o poema me anoitece.
A aranha tece teias.
O peixe beija e morde o que vê.
Eu escrevo apenas.
Tem que ter por quê?
Retrato de lado
retrato de frente
de mim me faça
ficar diferente
segundo consta
o mundo acabando,
podem ficar tranquilos.
Acaba voltando
tudo aquilo.
reconstruam tudo
Segundo a planta dos meus versos.
Vento, eu disse como.
Nuvem, eu disse quando.
Sol, casa, rua,
reinos, ruínas, anos,
Disse como éramos.
Amor, eu disse como.
E como era mesmo?
Sem Budismo
poema que é bom
acaba zero a zero.
Acaba com.
Não como eu quero.
Começa sem.
Com, digamos, certo verso,
veneno de letra,
bolero, Ou menos.
Tira daqui, bota dali,
um lugar, não caminho.
Prossegue de si.
Seguro morreu de velho,
e sozinho.
sexta-feira, 9 de outubro de 2009
Último Credo
Como ama o homem adúltero o adultério
E o ébrio a garrafa tóxica de rum,
Amo o coveiro - este ladrão comum
Que arrasta a gente para o cemitério!
É o trancendentalíssimo mistério!
É o nous, é o pneuma, é o ego sum qui sum,
É a morte, é esse danado número Um
Que matou Cristo e que matou Tibério!
Creio, como o filósofo mais crente,
Na generalidade decrescente
Com que a substância cósmica evolui ...
Creio, perante a evolução imensa,
Que o homem universal de amanhã vença
O homem particular que eu ontem fui!
sexta-feira, 2 de outubro de 2009
Esboço
Cara de palhaço
Pinta de boneco
Pula o tempo todo
Não dá nem uma parada
Parece até ligado
Na tomada
Todo emocionado
Com a própria brincadeira
Qualquer coisinha cai
Na choradeira
Uns dizem que é homem
Outros que é mulher
Dizem que é velho
Por isso pinta a cara
Pinta porque é moço
Pinta porque é velho
Pinta porque é macho
Pinta por capricho
Não é por nada disso
Não é homem, não é mulher
Ele é um bicho
E ele passeia, passeia
Passeia como se fosse um turista
E cumprimenta todo mundo
Que freqüenta a Bela Vista
E mesmo que ele esteja sem dinheiro
Dá uma passadinha nos botecos de Pinheiros
Chega com uma cara que dá pena
Mas é gente muito boa
Lá da Vila Madalena
Sempre sobra um copo de cerveja
Fica tão contente
Mas não quer que ninguém veja
Então procura o centro da cidade
Na Liberdade
Lá ele aparece algumas vezes
Lá os seus amigos são chineses
Canta umas canções em pot-pourri
E o pessoal morre de rir
E no fim da noite
Dá o último giro
No Bom Retiro
Meio delirante
Meio inconseqüente
Muito colorido
Um destaque na paisagem
É todo uma figura
Um personagem
Não adianta perder tempo
Desprezando a sua imagem
Pois nunca ele ligou
Pra essas bobagens
Corpo de moleque
Corpo de borracha
Todo amolecido
Dobra tudo
Nada racha
Dizem que é um esboço
Que é alguém de carne e osso
Dizem que é um colosso
Por dentro e por fora
É gente como a gente
A gente sente
Pois se aperta ela chora
E ele vagueia, vagueia
Vagueia como se fosse um cachorro
Avança, volta um pouco
Chegando até Socorro
Lá ele não conhece muita gente
Então pega a Marginal, o Jóquei Clube
E segue em frente
Gosta de entrar um pouco na USP
Gosta de sentir que é estudante
Mesmo que não estude ele embroma
Com tanta perfeição
Que sempre sai com um diploma
E vem pra casa então todo feliz
Em Vila Beatriz
Tem os seus horários de paquera
Tem o seu lugar no Ibirapuera
Tem o seu amor em Santo Amaro
Que ele encontra pelo faro
E tem um gosto muito próprio
E muito raro
Balança a cabeça
Mexe o coração
Passa pela Penha
Pela Lapa, pelo Brás
E já não sabe bem mais
O que faz
Todo envergonhado
Quando encontra uma criança
Perde o rebolado
Sempre dança
Tido como louco
Fala muito pouco
Pula, gesticula
Flexível, inquebrável
Vai ver que ele é amável
Vai ver, é provável
Vai ver que ele é uma fera
Vai ver que ele devora
Vai ver que cê chegando
Bem pertinho, dando um sopro
Ele evapora.
Barcas
O oceano engole todas barcas
O oceano lambe todas docas
Sei,
Os pensamentos
Os ventos levam
Muito mais longe
Feito os barcos
Mas pensamentos
Também naufragam
O mar é fundo,
É fundo!
Barcas
O oceano engole todas barcas
O oceano lambe todas docas
Sei,
Por muito tempo
Os homens erram
Cruzam o espaço
Céu infinito
Mas sei também
Que só repousam
Em terra firme
Terra!
Barcas
O oceano engole todas barcas
O oceano lambe todas docas.
quarta-feira, 30 de setembro de 2009
Ismália
Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.
No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...
E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava longe do céu...
Estava longe do mar...
E como um anjo pendeu
As asas para voar. . .
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...
As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma, subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar...
terça-feira, 29 de setembro de 2009
Fome Come
Gente tô ficando impaciente
Minha fome é persistente
Come frio, come quente,
come o que vê pela frente.
Come a língua, come o dente,
Qualquer coisa que alimente.
A fome come simplesmente,
Come tudo no ambiente.
Tudo que seja atraente,
é uma fome absorvente,
come e nunca é suficiente.
Toda fome é tão carente,
come o amor que a gente sente.
A fome come eternamente,
no passado e no presente.
A fome é sempre descontente.
Fome come, fome come.
Se vem de fora (ela devora, ela devora, ela devora)
(Qualquer coisa que alimente)
Se for cultura (ela tritura, ela tritura)
Se o que vem é uma cantiga (ela mastiga, ela mastiga.)
Ela então nunca descute (só deglute, só deglute)
E se for conversa mole (se for mole ela engole)
Se faz falto no abdomê
(fome come, fome come)
(Gente tô ficando impaciente)
(a fome é sempre descontente)
(Toda fome é tão carente)
(Qualquer coisa que alimente)
(Come o amor que a gente sente)
(Come o amor que a gente sente)
Gento tô ficando impaciente
Minha fome é persistente
Come frio, come quente,
come o que vê pela frente.
Come a língua, come o dente,
Qualquer coisa que alimente.
A fome come simplesmente,
Come tudo no ambiente.
Tudo que seja atraente,
é uma fome absorvente,
come e nunca é suficiente.
Toda fome é tão carente,
come o amor que a gente sente.
A fome come eternamente,
no passado e no presente.
A fome é sempre descontente.
Fome come, fome come.
Se vem de fora (ela devora, ela devora, ela devora)
(Qualquer coisa que alimente)
Se for cultura (ela tritura, ela tritura)
Se o que vem é uma cantiga (ela mastiga, ela mastiga.)
Ela então nunca descute (só deglute, só deglute)
E se for conversa mole (se for mole ela engole)
Se faz falto no abdomê
(fome come, fome come).
Mente, Mente
Por favor chegue cedo
E abra a porta devagar
Devagar, devagar
Cante uma canção lenta
Lenta, lenta, lenta, lenta
Ou ligue o rádio baixo
Baixo, baixo, baixo, baixo...
Deite ao meu lado calmamente
Mente, mente, mente, mente
E me aperte furiosamente
Mente, mente, mente, mente
E me deixe alto, alto, alto...
Daí eu te prometo
Prometo sim
Te deixar
Mole, mole, mole...
Lábios Que Eu Beijei
Lábios que beijei
Mãos que afaguei
Numa noite de luar, assim,
O mar na solidão bramia
E o vento a soluçar, pedia
Que fosses sincera para mim.
Nada tu ouviste
E logo que partiste
Para os braços de outro amor.
Eu fiquei chorando
Minha mágoa cantando
Sou estátua perenal da dor.
Passo os dias soluçando com meu pinho
Carpindo a minha dor, sozinho
Sem esperanças de vê-la jamais
Deus tem compaixão deste infeliz
Porque sofrer assim
Compadei-vos dos meus ais.
Tua imagem permanece imaculada
Em minha retina cansada
De chorar por teu amor.
Lábios que beijei
Mãos que afaguei
Terra Negra
Numa terra negra
que mal acredito,
num planeta alheio
a este céu tão lúcido,
num planeta fora
de todas as órbitas,
a horas que não ousam
fixar os relógios,
se derramam lívidas
torrentes de sangue
para o bom cultivo
de jardins recônditos.
A flora macabra
com legados de honra
precisa de sangue
para alimentar-se!
Dálias e papoulas
de um parque vindouro
surgirão do solo
para que outros seres
- chegado o seu turno -
calados pereçam.
Mais sangue, mais seiva
para a terra negra!
A festa é de púrpura?
Quereis sangue rubro?
Tomai-o dos poetas
que se retemperam,
as liras ao fogo.
Quereis sangue claro
de nascente rosa?
Tomai-o das crianças,
tomai-o das jovens
mulheres redondas
que exibem segredos
de felicidade.
Sangüíneas inéditas
de várias espécies!
Um dia que eu vejo
em futuro próximo
romperá o sol
sufocando a terra
negra, negra terra,
babujando-a com
lodosos, espessos
vômitos de sangue.
segunda-feira, 28 de setembro de 2009
Auto-Retrato
Às vezes sou um, às vezes sou outro:
Todo mundo é assim, ou é assado.
Eu, sem fugir à regra, transgredi.
Fui, ao mesmo tempo, eu e o outro
- um para dentro, outro para os outros
Mas, confesso, sou igual a todos
Num disfarce que é a outra face
De uma falsa dicotomia.
Nem religioso eu sou, nem romântico,
Muito menos ideólogo ou assumido
De qualquer coisa, na minha infidelidade,
Falta de fé. E, no entanto, obstinado
Quase otimista porque realista
- na reversão da contradição.
Sou um pouco o Orlando de Virginia Woolf
O Patinho Feio disfarçado de Dorian Gray.
Li uma montanha inexpugnável de livros
Tentei reescrevê-los, sem qualquer humildade
Subi, letra a letra, degraus estonteantes
Delirantes, construindo arquiteturas etéreas
No circulo vicioso das virtualidade banais.
Deveria rasgar todas as frases deletérias
Todas as imprecações, todas as contrafações
Verbais e veniais que produzi – lixo execrável.
Deveria envergonhar-me de minha falsa polidez
De minha insensatez, minhas impropriedades
Mas sempre tenho a firmeza dos inseguros
Enquanto os crédulos, os convictos
Não resistem às próprias contradições.
Transgredi mas, juro, apenas verbalmente.
No mais, sou casto na minha perversidade.
Sou beato na minha mais intima heresia.
E mais desprentensioso do que a minha soberba.
Quero dizer: no fundo sou inseguro e fiel
A princípios de que nem participo.
Deu para entender? Nem Deus pressente
Aquela dor que finjo que deveras sinto
Ao plagiar aquele poeta que nem mesmo venero.
Brasil, Brasis
O Brasil que eu vejo se imagina
Diferente em seus ínclitos fervores
Mas que é, nas entranhas férteis
- horrores! – miragens e estertores.
Um Brasil que se dá negando
Seus favores. Palavras vazias,
Luzidias, ostentando insígnias
Na imensidão insólita
Voraz. Continental. Etc. e tal.
De paredes alcalinas,
Ou de pedras de alcantaria;
Dormentes pungentes,
Vociferando seus rancores.
Seus amores.
Brasil que se sabe imperfeito
Em sua completeza,
Natureza falaz.
(...)
A Pátria dói nas entrelinhas!
(...)
Patria que se derrama pelos esgotos,
Pelos escombros, como escambo,
Favores e escárnio. Raios!
(...)
O Brasil que se mostra não é
O que é, mesmo que verdadeiro.
(...)
O Brasil é uma nota de rodapé.
Terra dos papagaios,
Pára-raios, parabólicas,
Das multidões distraídas,
Sefreguidões.
Mas a gente ainda chega lá.
O Brasil que a gente sonha
Tem contornos de mulher,
Tem ancas, bumbum, potrancas,
Duas polegadas a mais.
(...)
Todos os brasis no relicário,
Todos os brasões, armários,
Virgens, salafrários,
Não obstante os altares profanos,
Os terreiros, a jaca de aroma
Afrodisíaco. Tudo ou nada.
(...)
O Brasil é um ponto de exclamação,
Extrema-unção,
Salve-se quem puder!
(...)
Do Brasil que historiamos
Saem heróis e estatuas eqüestres.
Inconfidentes, videntes,
Vedetes. Santos barrocos,
Piás, jangadeiros,
Campeões de formula um.
(...)
Porque o Brasil é muitas vezes,
É muito mais, é isso aí,
É aquele abraço,
É o jeito e trejeito,
É a hóstia e o despacho.
(...)
Mãe gentil,
Teu filho pródigo,
Teu amante endividado,
Tua razão e o nosso ser,
Hipotecado de amor,
E de esperança.
Brasil.
Tenho Tanto Sentimento
Tenho tanto sentimento
Que é freqüente persuadir-me
De que sou sentimental,
Mas reconheço, ao medir-me,
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal.
Temos, todos que vivemos,
Uma vida que é vivida
E outra vida que é pensada,
E a única vida que temos
É essa que é dividida
Entre a verdadeira e a errada.
Qual porém é a verdadeira
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira
Que a vida que a gente tem
É a que tem que pensar.
domingo, 27 de setembro de 2009
Temor
Ao gozo, ao gozo, amiga. O chão que pisas
A cada instante te oferece a cova.
Pisemos devagar. Olhe que a terra
Não sinta o nosso peso.
Deitemo-nos aqui. Abre-me os braços.
Escondamo-nos um no seio do outro.
Não há de assim nos avistar a morte,
Ou morreremos juntos.
Não fales muito. Uma palavra basta
Murmurada, em segredo, ao pé do ouvido.
Nada, nada de voz, - nem um suspiro,
Nem um arfar mais forte.
Fala-me só com o revolver dos olhos.
Tenho-me afeito à inteligência deles.
Deixa-me os lábios teus, rubros de encanto.
Somente pra os meus beijos.
Ao gozo, ao gozo, amiga. O chão que pisas
A cada instante te oferece a cova.
Pisemos devagar. Olha que a terra
Não sinta o nosso peso
sexta-feira, 25 de setembro de 2009
Uma Estadia No Inferno
Antigamente, se bem me lembro, a minha vida era um festim, onde se abriam todos os corações, corriam todos os vinhos. Uma noite, sentei a Beleza no meu colo. - E a achei amarga. - E a xinguei.
Armei-me contra a justiça.
Fugi. Ó bruxas, ó miséria, ó ódio, meu tesouro foi confiado a vocês!
Consegui apagar do meu espírito toda a esperança humana. Para estrangular toda alegria, dei o bote surdo da fera.
Chamei os carrascos para, morrendo, morder a coronha de seus fuzis. Chamei os flagelos para sufocar-me com a areia, o sangue. A desgraça foi meu Deus. Deitei na lama. Sequei no ar do crime. E preguei boas peças à loucura.
E a primavera me trouxe o medonho riso do idiota.
E ultimamente, estando quase ao ponto de dar a minha última nota falsa!, pensei procurar a chave do antigo festim, onde reencontrarei talvez o apetite.
A caridade é esta chave. - Esta inspiração prova que sonhei.
"Você continuará hiena, etc...", exclama o demônio que me coroou com tão amáveis papoulas. "Ganhe a morte com todos teus apetites, e teu egoísmo e todos os pecados capitais."
Ah! peguei disto demais: - Mas, meu caro Satanás, vos conjuro, uma pupila menos irritada! e aguardando algumas pequenas covardias atrasadas, vós que amais no escritor a ausência das faculdades descritivas ou instrutivas, vos destaco estas horrendas folhas do meu carnê de danado
Vênus Anadiómena
Como de um caixão verde de lata, uma cabeça
De mulher de cabelos morenos e muita pomada
De uma velha banheira emerge, lenta e avessa,
Com seus déficits mal refeitos de uma garibada;
Vem depois o pescoço gordo e cinza, as largas omoplatas
Que sobressaem, as costas curtas que entram e saem;
E as redondezas dos rins querem saltar mas caem;
A gordura sob a pele aparece em folhas chatas;
A coluna é um pouco vermelha, e o todo tem um gosto
Horrível estranhamente; repara-se sobreposto
Algo singular que é preciso enxergar com lupa...
Os rins levam dois nomes gravados: CLARA VÊNUS;
— E este corpo todo mexe sua larga garupa
Bela horrendamente de uma chaga no ânus.
27 de julho 1870.
Rio
Rio que mora no mar
Sorrio pro meu Rio
Que tem no seu mar
Lindas flores que nascem morenas
em jardins de sal!
Rio - serras de veludo
Sorrio pro meu Rio
Que sorri de tudo
Que é dourado quase todo dia
E alegre como a luz!
Rio é mar
É terno se fazer amar
O meu Rio é lua
Amiga branca e nua
É sol, é sal, é sul
São mãos se descobrindo
Em tanto azul!
Por isso que meu Rio
Da mulher beleza
Acaba num instante
Com qualquer tristeza
Meu Rio que não dorme
Porque não se cansa
Meu Rio que balança
Sorrio, sorrio, sorrio...
Rio - serras de veludo...
Tristes Trópicos
O trópico tropica
Emaranhado no trambique
A treta frutifica
E tritura todo o pique
A trapaça trina e troa
E extrapola cada dique
O tratado é intrincado
Destratado é truque chique
O grito atravancado
Tranca até que eu petrifique
Tristes gregos e troianos
Desbragado piquenique
A Noite Do Meu Bem
Hoje eu quero a rosa mais linda que houver
Quero a primeira estrela que vier
Para enfeitar a noite do meu bem
Hoje eu quero a paz de criança dormindo
Quero o abandono de flores se abrindo
Para enfeitar a noite do meu bem
Quero a alegria de um barco voltando
Quero a ternura de mãos se encontrando
Para enfeitar a noite do meu bem
Hoje eu quero o amor, o amor mais profundo
Eu quero toda beleza do mundo
Para enfeitar a noite do meu bem
Mas como este bem demorou a chegar
Eu já nem sei se terei no olhar
Toda ternura que eu quero lhe dar
quinta-feira, 24 de setembro de 2009
Lá Em Mangueira
Lá em Mangueira
Aprendi a sapatear
Lá em Mangueira
É que o samba tem seu lugar
Foi lá no morro
Um luar e um barracão
Lá eu gostei de alguém
Que me tratou bem
Eu dei meu coração
No morro a gente
leva a vida que quer
No morro a gente
gosta de uma mulher
E quando a gente
deixa o morro e vai embora
Quase sempre chora
Chora, chora
Lá em Mangueira
Aprendi a sapatear
Lá em Mangueira
É que o samba tem seu lugar
Foi lá no morro
Um luar e um barracão
Lá eu gostei de alguém
Que me tratou bem
Eu dei meu coração
quarta-feira, 2 de setembro de 2009
Batuqueiro
Quanta previsão
a melodia faz
quantas intenções
ela anuncia
nos primeiros tons
bate o desejo
mal nos traz paz
já é nostalgia
quanta sensação
da bossa nova e jazz
quanta precisão
e improviso
vem alguém e diz
que é feliz
e não sabia
é que demorou
pra encontrar
a melodia
quanta vibração
pra um batuqueiro só
quantos corações
ele agita
com os primeiros dons
bate um pandeiro
mal coloca a voz
ganha o mundo inteiro
do sertão ao Rio
sobe o litoral
ganha algumas ilhas
do Caribe
chega a Montreal
atravessa o mar
cai em Portugal
passa por Berlim
Moscou ou Pequim
Ásia Oriental
olha o barulhão
que um batuqueiro faz
olha os corações
como palpitam
bate no ton-ton
feito um pandeiro
sabe desfilar
para um mundo inteiro.
domingo, 19 de julho de 2009
Sonho
Era um bosque, um arvoredo,
Uma sagrada espessura,
— Mitológica pintura
Que o romantismo não faz.
Era um sítio tão formoso,
Que nem um pincel romano,
Nem Rubens, nem Ticiano
Copiariam assaz.
Ali pensei que sonhava
Com a donzela que me inspira,
Que põe-me nas mãos a lira,
Que põe-me o estro a ferver;
Que me acalenta em seu colo,
Que me beija a vasta crente,
Que me obriga a ser mais crente
No Deus que ela julga crer.
Sonhei com a visão dourada,
Que todo o poeta sonha,
— Idéia gentil, risonha,
Tão poucas vezes real!
Que só, com o peito abafado,
Se vai de noite em segredo
Contar no denso arvoredo
Ao cipreste sepulcral.
Mas, despertando do sonho,
Que aos homens não se revela,
Achei comigo a donzela,
Me apertando o coração,
E ainda presa a meus lábios,
Entre um riso, entre um gemido,
Murmurou-me ao pé do ouvido
— Que não era um sonho, não. —
E não mais, enquanto vivo,
Deixarei esta espessura,
— Mitológica pintura
Que o romantismo não faz.
Era um sítio tão formoso,
Que nem o pincel romano,
Nem Rubens, nem Ticiano
Copiariam assaz.
Publicado no livro Obras Póstumas (1868*). Poema integrante da série Contradições Poéticas
quinta-feira, 25 de junho de 2009
Eu Sou Vertical
Mas não que não quisesse ser horizontal.
Não sou árvore com minha raiz no solo
Sugando minerais e amor materno
Para a cada março refulgir em folha,
Nem sou a beleza de um canteiro
Colhendo meu quinhão de Ohs e me exibindo em cor,
Desconhecendo que me despetalo em breve.
Comparados a mim, uma árvore é imortal
E um pendão nada alto, embora mais assombroso,
O que eu quero é a longevidade de uma e a audácia do outro.
À luz infinitesimal das estrelas,
Flores e árvores trescalam seus frios perfumes.
Eu me movo entre elas, mas nenhuma me nota.
Chego a pensar que pareço o mais perfeitamente
Com elas quando estou dormindo —
Os pensamentos esmaecem.
É mais natural para mim deitar.
Céu e eu então animamos a prosa,
Hei de servir no dia em que deitar afinal:
E as árvores aí talvez em mim tocassem e as flores comigo se ocupassem.
domingo, 14 de junho de 2009
Último Credo
Como ama o homem adúltero o adultério
E o ébrio a garrafa tóxica de rum,
Amo o coveiro -- este ladrão comum
Que arrasta a gente para o cemitério!
É o transcendentalíssimo mistério!
É o nous, é o pneuma, é o ego sum qui sum,
É a morte, é esse danado número Um
Que matou Cristo e que matou Tibério!
Creio, como o filósofo mais crente,
na generalidade descrente
Com que a substância cósmica evolui...
Creio, perante a evolução imensa,
Que o homem universal de amanhã vença
O homem particular eu que ontem fui!
Versos Íntimos
Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão -- esta pantera --
Foi tua companheira inseparável!
Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente invevitável
Necessidade de também ser fera.
Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
o beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
sexta-feira, 12 de junho de 2009
Revanche
Eu sei que já faz muito tempo que a gente volta aos princípios
Tentando acertar o passo usando mil artifícios
Mas sempre alguém tenta um salto, e a gente é que paga por isso, oh!
Fugimos prás grandes cidades, bichos do mato em busca do mito
De uma nova sociedade, escravos de um novo rito
Mas se tudo deu errado, quem é que vai pagar por isso?
Quem é que vai pagar por isso?
Quem é que vai pagar por isso?
Quem é que vai pagar por isso?
Eu não quero mais nenhuma chance, eu não quero mais revanche
Eu não quero mais nenhuma chance, eu não quero mais...
A favela é a nova senzala, correntes da velha tribo
E a sala é a nova cela, prisioneiros nas grades do vídeo
E se o sol ainda nasce quadrado, e a gente ainda paga por isso
E a gente ainda paga por isso, e a gente ainda paga por isso
E a gente ainda paga por isso
Eu não quero mais nenhuma chance, eu não quero mais revanche
Eu não quero mais nenhuma chance, eu não quero mais...
O café, um cigarro, um trago, tudo isso não é vício
São companheiros da solidão, mas isso só foi no início
Hoje em dia somos todos escravos, e quem é que vai pagar por isso
Quem é que vai pagar por isso?
Quem é que vai pagar por isso?
Quem é que vai pagar por isso?
Eu não quero mais nenhuma chance, eu não quero mais revanche
domingo, 7 de junho de 2009
Ângulos
Curvas dos sapatos
Espelhando esquinas
Números exatos
Cortam-se na brisa
Sóis luzem nos dentes
Você me diz
Vamos parar
Os ângulos retos
Domam seus cabelos
Automóveis pretos
Refletem sapatos
Lábios quase opacos
Você me diz
Vamos parar
Na sua voz
Passam tantas notas
Que não param pra notar
Dedos na mão
Que dorme à sombra do momento
Contam tempos soltos pelo bar
E o amor
Nuvem nos topos
Não encontra lagos
A curva dos copos
Reflete automóveis
Olhos quase secos
Você me diz
Vamos parar
Lágrima no pelo
Espelhando a nuvem
Álcool sobre o gelo
Nenhuma palavraUnhas sobre a louça
Você me diz
Vamos parar
Saudade Dada
Em horas inda louras, lindas
Clorindas e Helindas, brandas,
Brincam no tempo das berlindas,
As vindas vendo das varandas.
De onde ouvem vir a rir as vindas
Fitam a fio as frias bandas.
Ah!
Ah!
Não pode usar qualquer palavra
Então é por isso que não dava
Eu tentava, repetia, achava lindo e colocava
Se não cabe, se não pode
Tem que trocar de palavra
Ah!
Mas é tão boa essa palavra
Carregada de sentido com um som tão delicado
Agora eu vou ter que trocar?
Ah! Vá se danar
Ah! Tem que caber?
Ah! Ninguém repara
Ah! Tem que entender?
Ah! Mas tá na cara
Então muda?!?
Han... han...
Hum
Chiiii
Ai ai ai ai ai ai ai
Han?
Haa tá
Nossa!
É isso?!
Hei!
Hou!
Ara!
Ah!
Ah!
Quando O Sol Bater Na Janela Do Teu Quarto
Quando o sol bater
Na janela do teu quarto,
Lembra e vê
Que o caminho é um só,
Porque esperar
Se podemos começar
Tudo de novo?
Agora mesmo,
A humanidade é desumana
Mas ainda temos chance,
O sol nasce pra todos,
Só não sabe quem não quer,
o sol bater
Na janela do teu quarto,
Lembra e vê
Que o caminho é um só,
Até bem pouco tempo atrás,
Poderíamos mudar o mundo,
Quem roubou nossa coragem?
Tudo é dor,
E toda dor vem do desejo,
De não sentimos dor,
Quando o sol bater
Na janela do teu quarto,
Lembra e vê
Que o caminho é um só
sábado, 6 de junho de 2009
Desamparinho
música: Swami Jr.
Quando fico só
me dói uma tristeza
mulherando meu olhar
desvendando o céu
à procura de luz
numa noite sem luar
se você se vai
me mulato de dor
desconsigo de sorrir
me vejo mindinha
em passos dorminhosos
já me sozinhando ir
desnasci de ter
me poentei de sol
me fiz noite e me luei
e agora que sou
o silêncio de ser
desaprendo o que ensinei.
Enviada por: Divina Reis Jatobá
segunda-feira, 1 de junho de 2009
Prazer Solitário
Prazer solitário que se contorce,
me faz rolar na cama toda arrepiada,
molhada no aconchego dos travesseiros,
sou acariciada com dedos na quina
do convexo...
O prazer se faz em luz e cor,
Tudo começa dançar
freneticamente colorido.
aos poucos vai diminuindo...
tudo fica em branco e preto.
É o protesto firme do côncavo lascivo
que também quer!!!
Serás... Serei... ( Motivo Lírico )
I
Serás as nuvens,
serei o ar;
serás a noite, a Lua,
ou a praia sensual onde o mar tumultua,
- serei o mar;
serás a seiva, a terra,
a flor que abre a corola e as pétalas descerra,
ou uma deusa, e terás os teus cabelos verdes
e a humildade feliz de um girassol...
Serei o vento, o pólen, a ave inquieta
o dia claro e sem véus,
o deus primeiro, o poeta,
o fauno loiro dos céu
- serei o Sol
II
Serás a mata a trescalar perfume
na noite escura,
- serei o vaga-lume
à tua procura!
Serás a mata cerrada
e sombria,
tecida e emaranhada
como um ninho...
- serei a estrada
abrindo a mataria!
- serei o caminho!
III
Serás a estrela pequenina, pura
e brilhante,
ou a fonte que murmura
no coração da rocha de granito...
Serei o rio gigante,
ou o cume da montanha a desafiar a altura,
- serei o Infinito!
IV
Serás a pérola guardada
no estojo de uma concha nacarada,
polida e rebrilhante,
redonda, redondinha como as pupilas
tranqüilas
do teu olhar
Serei o diamante
envolto na ganga rude,
fiquei na terra
e não pude
ser polido pelo mar!
V
Serás a esperança que anima e seduz,
uma voz na distância
ou uma canção!
- Serei um hino!
Serás a luz!
a ilusão
- serei a ânsia,
o destino!
VI
Serás eternamente a imagem
desejada,
a miragem
que me acompanha os passos pela estrada,
seja para onde for,
- serás a visão perseguida!
Serei o conquistador!
Serás a vida!
Serei o amor!
Poema de JG de Araujo Jorge - do livro Eterno Motivo
- Prêmio Raul de Leoni, da Academia Carioca de Letras - 1943
quinta-feira, 14 de maio de 2009
Romance
I
A gente não é sério com dezessete anos.
— Uma bela noite, longe dos chopes e do anseio
Dos cafés barulhentos de lustres soberanos
— Vamos sob as tílias, verdes do passeio.
As tílias cheiram bem nas boas noites de junho!
O ar é às vezes tão doce que fechamos os olhos;
A cidade não está longe — o vento é testemunho —
Há perfumes de vinhedo e perfumes de cerveja...
II
— Eis que percebemos um pano pequenino
Azul-escuro, ladeado por um pequeno galho,
Com uma estrelinha má, sumindo
Aos doces arrepios, branca como orvalho...
Noite de junho! Dezessete anos! Embriagados.
A seiva é champanhe e lhe sobe à cabeça...
Divagamos; sentimos um beijo nos lábios
Que palpita lá, feito um bichano...
III
O coração louco vagueia como num romance,
— Quando, na luz de um pálido lampião,
Passa uma senhorita com encantos de relance,
Na sombra do colarinho temível do seu pai...
E, já que ela lhe acha imensamente ingênuo
Enquanto deixa trotar as suas botinas,
Ela se vira, alerta com um movimento tênue...
— Nos teus lábios então morrem as cavatinas...
IV
Você está apaixonado. Tomado até o mês de agosto.
Você está apaixonado. Seus poemas a fazem rir.
Todos os seus amigos fogem, você é de mau gosto.
— E a adorada, uma noite, concedeu-lhe uma carta!...
— Esta noite... — você entra nos cafés soberanos,
Você pede limonada ou um chope cheio...
— A gente não é sério com dezessete anos
E quando tem as tílias verdes do passeio.
quarta-feira, 29 de abril de 2009
Eu
Nas calçadas pisadas
de minha alma
passadas de loucos estalam
calcâneo de frases ásperas
Onde
forcas
esganam cidades
e em nós de nuvens coagulam
pescoço de torres
oblíquas
só
soluçando eu avanço por vias que se encruzi-lham
à vista
de crucifixos
polícias
(tradução: Haroldo de Campos)
segunda-feira, 13 de abril de 2009
Há Um Não Sei Que
Há um não sei que de fascinante
no teu modo autoritário de falar.
Há qualquer coisa provocante
na força penetrante do teu olhar.
Há uma promessa insinuante
no teu jeito de andar.
E em cada gesto uma suavidade cativante
uma ânsia escondida de quem sabe provocar.
E o que mais me perturba, francamente
eu queria agora te contar
mas é tão imenso e tão embriagante
que eu tenho medo de falar!
"Eu te desejo!"
Annabel Lee
Tradução: Fernando Pessoa
Foi há muitos e muitos anos já,
Num reino de ao pé do mar.
Como sabeis todos, vivia lá
Aquela que eu soube amar;
E vivia sem outro pensamento
Que amar-me e eu a adorar.
Eu era criança e ela era criança,
Neste reino ao pé do mar;
Mas o nosso amor era mais que amor --
O meu e o dela a amar;
Um amor que os anjos do céu vieram
a ambos nós invejar.
E foi esta a razão por que, há muitos anos,
Neste reino ao pé do mar,
Um vento saiu duma nuvem, gelando
A linda que eu soube amar;
E o seu parente fidalgo veio
De longe a me a tirar,
Para a fechar num sepulcro
Neste reino ao pé do mar.
E os anjos, menos felizes no céu,
Ainda a nos invejar...
Sim, foi essa a razão (como sabem todos,
Neste reino ao pé do mar)
Que o vento saiu da nuvem de noite
Gelando e matando a que eu soube amar.
Mas o nosso amor era mais que o amor
De muitos mais velhos a amar,
De muitos de mais meditar,
E nem os anjos do céu lá em cima,
Nem demônios debaixo do mar
Poderão separar a minha alma da alma
Da linda que eu soube amar.
Porque os luares tristonhos só me trazem sonhos
Da linda que eu soube amar;
E as estrelas nos ares só me lembram olhares
Da linda que eu soube amar;
E assim 'stou deitado toda a noite ao lado
Do meu anjo, meu anjo, meu sonho e meu fado,
No sepulcro ao pé do mar,
Ao pé do murmúrio do mar.
O Corvo
Tradução: Fernando Pessoa
Numa meia-noite agreste, quando eu lia, lento e triste,
Vagos, curiosos tomos de ciências ancestrais,
E já quase adormecia, ouvi o que parecia
O som de algúem que batia levemente a meus umbrais.
"Uma visita", eu me disse, "está batendo a meus umbrais.
É só isto, e nada mais."
Ah, que bem disso me lembro! Era no frio dezembro,
E o fogo, morrendo negro, urdia sombras desiguais.
Como eu qu'ria a madrugada, toda a noite aos livros dada
P'ra esquecer (em vão!) a amada, hoje entre hostes celestiais
-Essa cujo nome sabem as hostes celestiais,
Mas sem nome aqui jamais!
Como, a tremer frio e frouxo, cada reposteiro roxo
Me incutia, urdia estranhos terrores nunca antes tais!
Mas, a mim mesmo infundido força, eu ia repetindo,
"É uma visita pedindo entrada aqui em meus umbrais;
Uma visita tardia pede entrada em meus umbrais.
É só isto, e nada mais".
E, mais forte num instante, já nem tardo ou hesitante,
"Senhor", eu disse, "ou senhora, decerto me desculpais;
Mas eu ia adormecendo, quando viestes batendo,
Tão levemente batendo, batendo por meus umbrais,
Que mal ouvi..." E abri largos, franqueando-os, meus umbrais.
Noite, noite e nada mais.
A treva enorme fitando, fiquei perdido receando,
Dúbio e tais sonhos sonhando que os ninguém sonhou iguais.
Mas a noite era infinita, a paz profunda e maldita,
E a única palavra dita foi um nome cheio de ais
-Eu o disse, o nome dela, e o eco disse aos meus ais.
Isso só e nada mais.
Para dentro então volvendo, toda a alma em mim ardendo,
Não tardou que ouvisse novo som batendo mais e mais.
"Por certo", disse eu, "aquela bulha é na minha janela.
Vamos ver o que está nela, e o que são estes sinais.
"Meu coração se distraía pesquisando estes sinais.
"É o vento, e nada mais".
Abri então a vidraça, e eis que, com muita negaça,
Entrou grave e nobre um corvo dos bons tempos ancestrais.
Não fez nenhum cumprimento, não parou nem um momento,
Mas com ar solene e lento pousou sobre os meus umbrais,
Num alvo busto de Atena que há por sobre meus umbrais,
Foi, pousou, e nada mais.
E esta ave estranha e escura fez sorrir minha amargura
Com o solene decoro de seus ares rituais.
"Tens o aspecto tosquiado", disse eu, "mas de nobre e ousado,
Ó velho corvo emigrado lá das trevas infernais!
Dize-me qual o teu nome lá nas trevas infernais."
Disse o corvo, "Nunca mais".
Pasmei de ouvir este raro pássaro falar tão claro,
Inda que pouco sentido tivessem palavras tais.
Mas deve ser concedido que ninguém terá havido
Que uma ave tenha tido pousada nos meus umbrais,
Ave ou bicho sobre o busto que há por sobre seus umbrais,
Com o nome "Nunca mais".
Mas o corvo, sobre o busto, nada mais dissera, augusto,
Que essa frase, qual se nela a alma lhe ficasse em ais.
Nem mais voz nem movimento fez, e eu, em meu pensamento
Perdido, murmurei lento, "Amigo, sonhos - mortais
Todos - todos já se foram. Amanhã também te vais".
Disse o corvo, "Nunca mais".
A alma súbito movida por frase tão bem cabida,
"Por certo", disse eu, "são estas vozes usuais,
Aprendeu-as de algum dono, que a desgraça e o abandono
Seguiram até que o entono da alma se quebrou em ais,
E o bordão de desesp'rança de seu canto cheio de ais
Era este "Nunca mais".
Mas, fazendo inda a ave escura sorrir a minha amargura,
Sentei-me defronte dela, do alvo busto e meus umbrais;
E, enterrado na cadeira, pensei de muita maneira
Que qu'ria esta ave agoureia dos maus tempos ancestrais,
Esta ave negra e agoureira dos maus tempos ancestrais,
Com aquele "Nunca mais".
Comigo isto discorrendo, mas nem sílaba dizendo
À ave que na minha alma cravava os olhos fatais,
Isto e mais ia cismando, a cabeça reclinando
No veludo onde a luz punha vagas sobras desiguais,
Naquele veludo onde ela, entre as sobras desiguais,
Reclinar-se-á nunca mais!
Fez-se então o ar mais denso, como cheio dum incenso
Que anjos dessem, cujos leves passos soam musicais.
"Maldito!", a mim disse, "deu-te Deus, por anjos concedeu-te
O esquecimento; valeu-te. Toma-o, esquece, com teus ais,
O nome da que não esqueces, e que faz esses teus ais!"
Disse o corvo, "Nunca mais".
"Profeta", disse eu, "profeta - ou demônio ou ave preta!
Fosse diabo ou tempestade quem te trouxe a meus umbrais,
A este luto e este degredo, a esta noite e este segredo,
A esta casa de ância e medo, dize a esta alma a quem atrais
Se há um bálsamo longínquo para esta alma a quem atrais!
Disse o corvo, "Nunca mais".
"Profeta", disse eu, "profeta - ou demônio ou ave preta!
Pelo Deus ante quem ambos somos fracos e mortais.
Dize a esta alma entristecida se no Éden de outra vida
Verá essa hoje perdida entre hostes celestiais,
Essa cujo nome sabem as hostes celestiais!"
Disse o corvo, "Nunca mais".
"Que esse grito nos aparte, ave ou diabo!", eu disse. "Parte!
Torna á noite e à tempestade! Torna às trevas infernais!
Não deixes pena que ateste a mentira que disseste!
Minha solidão me reste! Tira-te de meus umbrais!
Tira o vulto de meu peito e a sombra de meus umbrais!"
Disse o corvo, "Nunca mais".
E o corvo, na noite infinda, está ainda, está ainda
No alvo busto de Atena que há por sobre os meus umbrais.
Seu olhar tem a medonha cor de um demônio que sonha,
E a luz lança-lhe a tristonha sombra no chão há mais e mais,
Libertar-se-á... nunca mais!
O Amor, Quando Se Revela
O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.
Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há-de dizer.
Fala: parece que mente...
Cala: parece esquecer...
Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pra saber que a estão a amar!
Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!
Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...
segunda-feira, 30 de março de 2009
Presença De Você
Toque...
com seus lábios a minha boca,
com suas mãos a minha pele,
com seu ser o meu querer.
Roube...
da minha boca beijos quentes,
da minha pele o desejo ardente,
do meu querer o entregar.
Cubra...
minha boca de delícias,
minha pele de malícias,
meu querer só de pecados.
Traga...
nos seus lábios o veneno,
nas suas mãos o obsceno,
no seu ser o meu prazer.
Pois preciso...
do meu coração acelerado,
do meu corpo embriagado
da presença de você.
Você Chegou
Sua presença tem sido marcante
em minha vida ultimamente,
tem me deixado mais confiante,
feito-me crescer realmente.
Meu pequeno mundo era triste
até você cruzar meu caminho,
porque tristeza nenhuma resiste
a tanta demonstração de carinho.
Com as tristes marcas da vida,
eu quase não conseguia caminhar,
sentia-me tão pouco querida,
até deixei de sonhar.
Mas um sopro inexplicável do destino,
colocou-me em suas mãos
e o que me parecia desatino
devolveu meu coração.
Percebi a minh'alma brilhar
e no amor voltar a crer...
Senti meu coração sarar,
de novo começar a bater.
Suas palavras vieram carinhosas,
no meu coração alojarem.
Senti-as como pétalas de rosas,
sobre mim, despencarem.
Fez-me sentir uma princesa,
quando de mimos me cobrindo
deu-me esta certeza:
você não estava mentindo.
Em minha vida, assim você entrou,
trazendo consigo a felicidade.
Meu coração finalmente encontrou,
quem me ama de verdade.
Eu Ando Assim, Meu Amor
O desejo aumentando...
Suspiros e devaneios,
Arfante roçar de seios,
Meu corpo está te chamando...
Percebo, dia após dia,
Que me desejas também.
E, enquanto não chega a hora,
Eu sonho, tal como agora,
Que desta vez você vem.
Que gosto terá teu beijo?
Um sabor de ambrosia
É o que estou imaginando,
Mas só saberei sugando
A tua boca macia...
Que aroma terá teu corpo?
Perfume de sedução...
Quero cheirá-lo inteirinho,
Saboreá-lo todinho,
Explodindo de paixão...
Nesta espera alucinada
Por tão ansiada festa,
Prazeres que tanto quero,
Em meu desejo sincero,
Aguardar é o que me resta.
Quero entregar-me inteira,
Com total insensatez,
Deixar-te me devorar,
E alucinadamente gozar
A nossa primeira vez...
quarta-feira, 25 de março de 2009
Fogo
Amor, estou morrendo de saudades tuas
Veja como fico quando paro para pensar em você
Minha temperatura sobe,
a saudade dói em meu peito
Não sei o que tem em você que me deixa assim
tão doida
Talvez seja o modo como me trata,
Me maltrata quando quero,
me ama quando preciso
Ou talvez seja esta paixão que me incendeia
o corpo todo
Ai amor, não sei,
são tantas coisas que me liga a você
Este ciúme que não me deixe um instante sequer
O medo que tenho de perde-lo
Vem amor, vem esfriar este corpinho em brasa
Vem me deixar cansadinha
e tirar este tesão que me atina
Não quero mais nada
a não ser o toque de tuas mãos
em meu corpo
Quero me deliciar de teu prazer,
derreter ao contato de teu corpo
Vem meu homem,
mais uma vez explorar sua pequena
Use e lambuze deste meu corpinho
que somente a ti pertence
Mata esta saudade que tenho de você
Acalme minhas taras e me deixe quatro.
Vem meu menino vadio,
sussurra lindas palavras só para mim
E depois me deixe adormecer em teus braços
para nunca mais acordar deste sonho lindo...
quarta-feira, 18 de março de 2009
Coração De Mulher
Coração de uma mulher
Guarda segredos mil
Nem ela consegue desvendar
Qual é o seu ardil
Por mais que intenta...
Querendo se entender
Coração com seus mistérios
Faz do amor seu ministério
Mas ama de modo errado
Como borboleta de flor em flor
Não se importando se é amado
Se irá causar ou sentir dor
Vive de muitos conflitos
Ama e deixa de amar
Na alma ecoa seus gritos
Acaba por a si mesmo magoar
Sem de a vida usufruir
Assim segue, vai vivendo.
Não consegue se definir
Sozinho, aos poucos vai morrendo.
Antes De Ti
Antes de ti -
Escrever era pragmático.
Dois versos superpostos
um aqui, outro ali.
Tudo simples, estático
sarcático.
Naquele tempo, sem você...
palavras eram peças calculadas
cuidadosamente estudadas,
jogo fugaz para entretecê.
Hoje muda, calada
no tinteiro a pena descansada
de saudade a boca amordaçada,
continuo como ontem...
Sem você!
Não Te Quero
Não te quero senão porque te quero,
e de querer-te a não te querer chego,
e de esperar-te quando não te espero,
passa o meu coração do frio ao fogo.
Quero-te só porque a ti te quero,
odeio-te sem fim e odiando te rogo,
e a medida do meu amor viajante,
é não te ver e amar-te,como um cego.
Talvez consumirá a luz de Janeiro,
seu raio cruel meu coração inteiro,
roubando-me a chave do sossego,
nesta história só eu me morro,
e morrerei de amor porque te quero,
porque te quero amor,
a sangue e fogo.
Nega-me o pão, o ar,
a luz, a primavera,
mas nunca o teu riso,
porque então morreria.
sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009
Copacabana
Existem praias
Tão lindas
Cheias de luz
Nennuma tem o encanto
Que tu possuisTuas areias
Teu céu tão lindo
Tuas sereias
Sempre sorrindo
Copacabana
Princesinha do mar
Pelas manhãs
Tu és a vida a cantar
E à tardinha
Ao sol poente
Deixas sempre
Uma saudade na gente
Copacabana
O mar eterno cantor
Ao te beijar
Ficou perdido de amor
E hoje vive a murmurar
Só a ti Copacabana
Eu hei de amar
Amor & Medo
Quando eu te vejo e me desvio cauto
Da luz de fogo que te cerca, ó bela,
Contigo dizes, suspirando amores:
"Meu Deus! que gelo, que frieza aquela!"
Como te enganas! meu amor, é chama
Que se alimenta no voraz segredo,
E se te fujo é que te adoro louco...
És bela — eu moço; tens amor, eu — medo...
Tenho medo de mim, de ti, de tudo,
Da luz, da sombra, do silêncio ou vozes.
Das folhas secas, do chorar das fontes,
Das horas longas a correr velozes.
O véu da noite me atormenta em dores
A luz da aurora me enternece os seios,
E ao vento fresco do cair das tardes,
Eu me estremece de cruéis receios.
É que esse vento que na várzea — ao longe,
Do colmo o fumo caprichoso ondeia,
Soprando um dia tornaria incêndio
A chama viva que teu riso ateia!
Ai! se abrasado crepitasse o cedro,
Cedendo ao raio que a tormenta envia:
Diz: — que seria da plantinha humilde,
Que à sombra dela tão feliz crescia?
A labareda que se enrosca ao tronco
Torrara a planta qual queimara o galho
E a pobre nunca reviver pudera.
Chovesse embora paternal orvalho!
Ai! se te visse no calor da sesta,
A mão tremente no calor das tuas,
Amarrotado o teu vestido branco,
Soltos cabelos nas espáduas nuas! ...
Ai! se eu te visse, Madalena pura,
Sobre o veludo reclinada a meio,
Olhos cerrados na volúpia doce,
Os braços frouxos — palpitante o seio!...
Ai! se eu te visse em languidez sublime,
Na face as rosas virginais do pejo,
Trêmula a fala, a protestar baixinho...
Vermelha a boca, soluçando um beijo!...
Diz: — que seria da pureza de anjo,
Das vestes alvas, do candor das asas?
Tu te queimaras, a pisar descalça,
Criança louca — sobre um chão de brasas!
No fogo vivo eu me abrasara inteiro!
Ébrio e sedento na fugaz vertigem,
Vil, machucara com meu dedo impuro
As pobres flores da grinalda virgem!
Vampiro infame, eu sorveria em beijos
Toda a inocência que teu lábio encerra,
E tu serias no lascivo abraço,
Anjo enlodado nos pauis da terra.
Depois... desperta no febril delírio,
— Olhos pisados — como um vão lamento,
Tu perguntaras: que é da minha coroa?...
Eu te diria: desfolhou-a o vento!...
Oh! não me chames coração de gelo!
Bem vês: traí-me no fatal segredo.
Se de ti fujo é que te adoro e muito!
És bela — eu moço; tens amor, eu — medo!...
quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009
Doce Recordação
Dedilho algo no piano e meu pensamento volita
em algum lugar que já estive no meu passado.
Fecho os olhos com saudade e , então penso,
o ontem em relação ao hoje... está tão distante.
Ontem , eu tinha uma menina tão linda , brejeira,
de cabelos lourinhos e olhos azuís, encantadores,
que brincava comigo pela casa...parece que ouço
seus gritinhos contagiantes - "NÃO PARE, MAMÃE"
Hoje, que passou tão rápido em relação ao ontem,
me encontro, no momento, tão só na recordação
e muito envolvida nesse pensamento engraçado.
O tempo galopou com seu alazão e me tornou vovó .
Obra Inacabada
Sempre entendi teu olhar
fascinante que me enviava
mensagens não codificadas,
pois nunca foi segredo
o que sentias por mim.
E, eu tão prontamente
com mãos de artista,
esculpi muitas vezes
o teu corpo sem o cinzel.
A obra?
A obra ficou inacabada...
volta, ainda dá tempo...
para terminar !
sexta-feira, 9 de janeiro de 2009
Emotividade Da Cor
A Dolores Marques Caplonch e a Miguel Caplonch
Sete cores — sete notas erradias,
sete notas da música do olhar,
sete notas de etéreas melodias,
de sons encantadores
que se compõem entre si,
formando outras tantas cores,
do cinzento que cisma ao jade que sorri.
Há momentos
em que a cor nos modifica os sentimentos,
ora fazendo bem, ora fazendo mal;
em tons calmos ou violentos,
a cor é sempre comunicativa,
amortece, reaviva,
tal a sua expressão emocional.
Lançai olhares investigadores
para a mancha dos poentes:
há cores que são ecos de outras cores,
cores sem vibrações, cores esfalecentes,
melodias que o olhar somente escuta,
na quietude absoluta,
ao Sol se pôr...
Quem há que inda não tenha percebido
o subjetivo ruído
da harmonia da cor?
(...)
— A Cor é o aroma em corpo e embriaga pelo olhar.
Cor é soluço, cor é gargalhada,
cor é lamento, é suspiro,
e grito de alma desesperada!
Muitas vezes a cor ao som prefiro
porque a minha emoção é igual à sua:
— parada, estatelada
dizendo tudo, sem que diga nada,
no prazer ou na dor.
Olhar a cor
é ouvi-la,
numa expressão tranquila,
falar de todas as sensações
caladas, dos corações;
no entanto, a cor tem brados,
mas brados estrangulados,
mágoas contidas,
mudo querer,
ânsia, fervor, emotividade
de desconhecidas
vidas,
que se ficaram na vontade,
que não conseguiram ser...
Cores são vagas, sugestivas toadas...
Cores são emoções paralisadas...
(...)
Publicado no livro Estados de alma (1917).
In: MACHADO, Gilka. Poesias completas. Apres. Eros Volúsia Machado. Rio de Janeiro: L. Christiano: FUNARJ, 1991, p. 141-