Alexei Bueno
Quando era noite, atrás daquela porta,
junto a uma vela duas velhas riam
Matando aos poucos uma aranha torta.
E a alegria que elas dividiam
Poucos tiveram já no mundo um dia,
Mas os que a achavam sempre a bendiziam.
Cheia de medo, a criatura fria
Dançava horrível rente de uma chama
Que lentamente o corpo lhe roía,
E as velhas rindo a observar da cama
Iam falando sobre de que modo
Com dor mais lenta um corpo vil se inflama.
Espécie estranha de um vivente lodo,
Sendo corcunda e só com sete pernas
A aranha uivava por seu corpo todo
Que se expandia em inchações externas
Causando às velhas, com o vermelho horrendo
Do seu ardor, as sensações mais ternas...
Emocionadas, com as mãos tremendo,
Vieram então com um bando de alfinetes
Que em cada pata foram se prendendo,
E a aranha presa de mil cacoetes
Foi só os espinhos de uma prata ardente
Que a recobria em infernais coletes.
E nesta arte foram indo em frente,
Depois agulhas, e um perfume ardido,
E ao fim de tudo uma tesoura ingente,
Até que o fogo e o animal vencido
Murcharam juntos sobre a mesa irada
Em mil pedaços de um negror transido,
E ambas as velhas, conhecendo o nada,
Com face imensa devoraram tudo
Que lhes restava da fatal jornada.
Enquanto, a olhá-las, um retrato mudo
De seu marido ia chorando as dores
Que o recobriam no ancestral escudo,
E todo o chão ia se abrindo em flores
E uma criança, que ninguém notara,
Pela janela olhava sem temores
E ia crescendo, e de uma forma rara,
Enquanto as velhas, enxugando as portas,
Varriam tétricas, na noite clara,
Todo o amargor das profecias mortas!
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